Violência nas escolas,
inversão de valores
Duas gerações que se
conflitam na formação do caráter de crianças e adolescentes. Homens e mulheres
educados numa época em que havia respeito familiar e social, não concebem o que
aconteceu de lá pra cá. O desajuste levou outros órgãos da esfera pública a ‘ajudar’
as famílias e o Estado a educar a nova geração.
Maiara Pires
Um desajuste generalizado na formação do caráter de crianças
e adolescentes, levou diversos órgãos que não são diretamente ligados ao campo
educacional, a se mobilizarem para ‘ajudar’ as famílias e o Estado a educar a
nova geração. Foi-se o tempo em que os filhos honravam pai e mãe e que o
professor era tratado com a reverência de Mestre na sala de aula. A nova
geração se conflita com os valores da boa moral e dos bons costumes. Homens e
mulheres educados numa época em que ainda havia respeito familiar e social, não
conseguem conceber o que aconteceu de lá pra cá.
Criados há 27 anos para assegurar os direitos da criança e do
adolescente, os conselhos tutelares foram estereotipados como entidades que não
deixam os pais educarem os filhos. A alcunha é prontamente rebatida pela
conselheira Huelma Medeiros: “O conselho
tutelar não é inimigo do pai e da mãe. Ele é um parceiro na orientação das
nossas crianças e adolescentes. Somos a favor do diálogo e da conversa. Quando
a repressão se transforma em espancamento, violência e brutalidade, aí nós
entramos em cena para assegurar um direito que está sendo violado”.
A falta de referencial de pai e mãe é um agravante apontado
por órgãos como secretarias de educação, Polícia Militar, conselhos tutelares e
outros, para que crianças e adolescentes sejam ‘educados pelo mundo’. “Em ações que acompanhamos do Comissariado
Infância e da Juventude, encontramos crianças de 10, 11 anos de madrugada em
eventos noturnos consumindo drogas e bebida alcóolica. Onde estão os pais que
não sentem a falta dos filhos ou não colocam limites para eles?”, indaga a
conselheira Huelma, depois de citar o histórico familiar de alguns casos
atendidos, como pais separados, familiares que incentivam a ingestão de bebida
alcóolica e uso de drogas, entre outros.
Desajuste social
Ainda com relação ao papel da família, o coordenador de Apoio
ao Educando (CAED), departamento ligado à Secretaria de Estado da Educação
(Seed), Manoel Miranda, lembra que “a
educação não se faz na escola, se replica dentro da escola”. Ele destaca,
ainda, que a formação de princípios e valores nunca saiu da responsabilidade da
família. E faz questão de citar o Art 205 da Constituição Federal que diz: “a
educação é um dever do Estado e da família”. A fala de Manoel Miranda demonstra
a angústia dos gestores da educação que, diariamente, são cobrados e
responsabilizados pela má formação dos estudantes.
A conselheira Huelma chamou a atenção para outro comportamento
que, quase não se vê nos dias de hoje. “O
pai e a mãe tem que estar na escola acompanhando o desempenho dos filhos.
Existem situações em que os pais não sabem com quem o seu filho se relaciona”,
comentou ela, antes de fazer um panorama do comportamento da nova geração de
crianças a adolescentes em ambiente escolar. Segundo relatou, existe violência
entre alunos; entre professores e alunos; entre gestores e alunos e; entre
familiares e alunos.
O próprio atual secretário de Estado da Justiça e Segurança
Pública (Sejusp), Ericláudio Alencar, confirmou que a até dois anos atrás,
quando atuava como delegado de Polícia Civil no Amapá, encontrava diretores de
escola e professores espancados na delegacia, por diversas vezes durante o seu
plantão.
O que também chamou a atenção da conselheira tutelar é que o
desarranjo social independe da condição financeira da família. “Atendemos crianças e adolescentes de todas
as classes sociais. O desajuste está generalizado. O que acontece é que existe
um mundo preparado para receber estes adolescentes: o acesso fácil à bebida, o
tráfico, as facções”, observou.
Para tentar resolver essa ‘bronca’ que pendeu mais para o seu
colo, a Secretaria de Estado da Educação busca parceiros para implementar
metodologias que minimizem os conflitos no ambiente escolar. É o caso das
práticas restaurativas, que são meios para solucionar os conflitos internos e promoção
da paz no ambiente escolar, uma iniciativa do Ministério Público do Estado do
Amapá (MP/AP). Algumas escolas já aderiram e em 2017, a titular da Seed, Goreth
Sousa, quer fortalecer as práticas restaurativas em outras instituições de
Macapá e Santana.
Assim como o Ministério Público, que percebeu que o caso é
sério nas escolas, o Tribunal de Justiça do Amapá (Tjap) também fez a sua parte
para contribuir com a cultura da paz nestas instituições e lançou em agosto de
2015, o Programa de Mediação Escolar. O projeto capacita profissionais da
própria escola, para atuarem como mediadores de conflitos.
O coordenador de Apoio ao Educando/Seed, Manoel Miranda, fez
uma análise da intervenção do Judiciário neste processo educacional: “É uma mudança de paradigma. A justiça passa
a deixar de trabalhar num contexto reativo, para trabalhar num contexto
proativo”, frisou ele, enaltecendo a iniciativa.
Segurança nas escolas
em 2017
No planejamento da Secretaria de Estado da Educação para
2017, também consta a vigilância física patrimonial na área rural e em unidades
de risco na área urbana; a volta de agentes de portaria, principalmente,
durante o dia; o sistema de monitoramento eletrônico online interligado com o Centro
Integrado de Operações de Defesa Social (Ciodes). Neste sistema de vigilância
eletrônica, os professores e gestores escolares poderão ajudar no
monitoramento, por meio de um aplicativo de celular. Além destes mecanismos, a
Seed também vai fortalecer as parcerias com outras instituições, a exemplo da
Polícia Militar.
A Major Marizete Magalhães que atua na Coordenação do
Policiamento Escolar Comunitário, já antecipou que a Secretaria de Estado da
Justiça e Segurança Pública, irá promover cursos para aspirantes a oficiais e
cursos de policiamento escolar para os militares atuarem conforme as diretrizes
do Ministério da Justiça e segurança pública nacional.
Ela destacou que outros projetos sociais da Polícia Militar
continuarão ao longo do ano letivo de 2017, a exemplo do Programa Educacional
de Resistencia as Drogas (Proerd). Por meio desse programa, além das rondas nas
escolas, os policiais ministram palestras abordando diversos temas da vivência
de crianças e adolescentes.
A intervenção da polícia no ambiente escolar, tem retirado
diversos objetos ilícitos do convívio dos alunos. Durante um ano do projeto de
Policiamento Escolar Comunitário (2016-2017), quatro batalhões de polícia (1º
BPM, 2º BPM, 4º BPM e 6º BPM) conseguiram tirar de circulação em torno de 150
itens como arma branca, munição, simulacro, entorpecente e duas armas de fogo.
Simpósio
Toda essa problemática levou a Coordenadoria Estadual de
Segurança Comunitária (CSC) a promover nos dias 12 e 13 de janeiro, o I
Simpósio de Policiamento Escolar Comunitário. O evento buscou discutir e
apresentar conclusões sobre a atuação da Polícia Militar do Amapá na segurança
da escolas da rede estadual de ensino.
Temas como pacificação de conflitos no ambiente escolar,
atividades desenvolvidas pelo Conselho Tutelar e práticas socioeducativas
aplicadas à criança e ao adolescente, foram alguns assuntos debatidos. O
Simpósio reuniu representantes do Ministério Público, Vara da Infância e
Juventude, Conselho Tutelar, Polícia Militar e Secretaria de Estado da
Educação, no Auditório da Sejusp, em Macapá.
Uma informação divulgada no Simpósio que intrigou o
coordenador de Apoio ao Educando/Seed, Maonel Miranda, foi a destinação de R$
44 milhões do Ministério da Justiça ao Amapá para o sistema prisional, enquanto
que, em 2016, o Amapá perdeu uma cifra aproximada de R$ 41 milhões, em repasses
federais para a educação. “É trágico”,
resumiu o gestor ao lamentar a visão míope do poder público para o sistema educacional.
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