Autor: José Alberto Tostes
Pensar a cidade no Brasil ainda é algo que parece surreal. Os problemas são
tantos que os gestores não têm mais respostas prontas, entre os gravíssimos dramas
estão: coleta do lixo, limpeza pública, transportes públicos, educação e
saúde. Quanto maior a cidade, maior a escala de diferentes problemas. É
incrível que a maior parte da solução dos problemas está na própria comunidade.
A vida em comunidade não tem sido fácil. Os conflitos têm sido inevitáveis e
cotidianos. Quem visita a prefeitura de qualquer município brasileiro que lida
com as questões urbanas diárias, saí de lá com a crença de que estamos um caos
total.
Quais as causas que contribuíram para este cenário? Seria fácil responder,
dizer que a maior culpa está na irresponsabilidade de gestores que deixaram de
fazer a sua parte. Nesta reflexão, irei me deter falar do papel da comunidade,
viver em comum, significa respeitar o conjunto das diferentes coletividades,
mas não é assim que acontece, vive-se sobre a síndrome da intolerância. A
chamada relação de direitos e deveres é completamente secundária, quando boa
parte, acredita que só existem direitos.
Em um momento dito de crise, não se deve restringir somente a ideia de crise
econômica, mas de ideias, atos, ações e estratégias, comum a todos. São tantos
conflitos diários, com certeza gastamos milhares e milhões de horas para
equacionar tudo. São problemas de energia, água, telefonia, acidentes de
trânsito, violência e tantos outros pequenos conflitos.
Verdadeiramente nos falta um conceito de cidade. Precisamos aprender a conviver
coletivamente, assim como vivemos em família, muito embora, boa parte das
famílias o conflito seja permanente. O conceito de viver em comunidade
ocorre quando deixamos de pensar somente na individualidade para pensar no
coletivo, neste caso, todos têm que contribuir de forma irrestrita. O sujeito
que joga lixo na rua, no canal, na frente da sua casa, é um infrator. Outro
sujeito que faz fogueiras gerando grandes nuvens de fumaça, aqueles que
estacionam em lugar proibido, em vagas restritas, aquele que fura a fila para
ter algum tipo de privilegio. Tais exemplos são coisas cotidianas que poderiam
ser evitadas com informação e civilidade.
Em período de eleições, todo candidato, diz que vai fazer
isso ou aquilo, que vai construir mais escolas, mais postos de saúde, vai
colocar mais transportes coletivos, todavia ninguém diz, que vai investir mais
em civilidade do lugar, de como, vamos gastar menos e ter mais qualidade de
vida urbana. Como é possível uma feira vender produtos alimentícios, se no seu
entorno está cheio de lixo e entulho jogado pelos próprios feirantes, que estão
sempre a espera da benevolência do poder público. A responsabilidade é de
todos, de quem vende, de quem compra e aceita produtos em condições de
indigência. Então, a vida em comunidade parece mais difícil que possamos
imaginar.
Pensa-se em tanta coisa para ensinar nas escolas, disciplina de todo tipo, mas
não se idealiza investimentos em civilidade. Como conviver em comunidade?
O comportamento individual e coletivo é imprescindível para alcançarmos
minimamente algum tipo de qualidade. Não há dinheiro que chegue para algo que é
mal administrado. A cidade não pode ser um grande depósito. Os governos e a
sociedade civil investem pouco em campanhas de esclarecimento e orientação.
Outro dia, um sujeito disse: “o Pronto Socorro
era um ambiente indigente”, então, indaguei a ele o seguinte: “Qual a sua
solução para este problema”, ele respondeu que tem que ter mais médicos e mais
espaço para atender o público, novamente lhe proporcionei a reflexão sobre
o assunto com outra indagação: “ Você acha que isso resolveria”, ele fica em
silêncio. Tudo na vida cotidiana é planejamento e gestão, se você gastar mais
do que arrecada, ficará sempre devendo, assim é a cidade, quanto menos
investimentos, maior será o débito com as questões urbanas.
A grande maioria dos problemas urbanos está localizada nas condições de moradia
inóspita e inadequada, gera múltiplas doenças que poderiam ser evitadas,
evitando assim, a sobrecarga nos hospitais e no Pronto Socorro. Os exemplos
estão postos, temos um problema para resolver, a questão da civilidade. Vivemos
em comunidade de forma embrutecida, a intolerância fala mais alto quando se
discute em favor do coletivo. O reflexo está no ambiente da cidade. Espaços
públicos desestruturados, ambientes segregados, aumento dos índices de
violência, degradação de vias, pontos de transportes coletivos quebrados, etc.
A vida em comunidade começa com pequenos atos e
atitudes. O poder público não tem mais respostas, tudo está na mão da
sociedade. A cada ação clandestina dos munícipes, maior será custo para
corrigi-la. Sempre se afirma que é preciso mais recursos, a pergunta é: precisa
de mais recursos, ou de redimensionar ações para aperfeiçoar o que já existe? O
que se vê, é a perda enorme de recursos por conta da má aplicação e da perda
por inadequação dos projetos.
Por um conceito de cidade, nos leva a outros possíveis indicadores, da real
necessidade de maior participação de todos, não basta chegar à porta do
prefeito e de outras instituições pedindo por melhorias. As causas de muitos
dos problemas têm origem na própria comunidade. Por um conceito de cidade,
requer integração entre as políticas, ações e estratégias, evitar a
fragmentação, zelar pelo orçamento público e alcançar em médio prazo as metas
planejadas.
Vive-se a síndrome da desconfiança institucional,
todos desconfiam de todos, isso representa uma grande perda dos valores de vida
em comum. Uma das causas para todo este processo reside na maneira como são
constituídas as relações, com base no compadrio e no apadrinhamento.
Por um conceito de cidade, requer evitar rupturas na estrutura do tecido
urbano, revitalizar os ambientes públicos, adequar às condições do sistema de
transporte modal, evitar projetos temporários e eleitoreiros, organizar melhor
atividades de saúde e educação, finalmente investir corretamente em sistemas de
tecnologia de última geração. Quanto à comunidade, precisa agir de outra forma
que não seja aquela que beneficia apenas uma minoria. A vida urbana em
comunidade não pode ser a perda dos valores, da memória e da qualidade de vida.
Fui indagado sobre o que precisa a cidade de Macapá que irá completar, 258
anos, respondi que o maior problema de Macapá não é somente a escassez de
infraestrutura urbana, mas construir melhor o emponderamento social. É
fundamental que todos os segmentos da sociedade compreendam. O que faz uma
sociedade e uma cidade melhor com maior e melhor qualidade de vida é a
mobilização e a partilha social.
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